Há
um tempinho, num dia de meio da semana e finzinho de semestre, eu deitei na
minha cama e dormi por 9 horas seguidas sem colocar o celular pra
despertar ou deixar o blecaute aberto para o sol me acordar. Talvez isso seja
um acontecimento até curioso pra quem conhece meu jeito agoniado, mas com certeza
não deveria ser um fato que me gerasse tanta reflexão. Antes desse dia, eu
tinha passado quase duas semanas sem conseguir dormir mais de 3 horas por
noite. Não tinha final de semana, viagem ou doença que me fizesse parar um
pouco, eu até estava ciente de que meu cansaço, na realidade, me fazia mais
improdutiva, mas era meu corpo que involuntariamente não conseguia descansar,
de um jeito tal que às cinco e meia de manhã eu acordava assustada e sentindo a
consciência pesada, mesmo sabendo que eu só tinha ido pra cama porque às três
da manhã eu estava desabada e babando em cima do computador.
Eu
não sei qual porcentagem de culpa eu devo colocar nos fatores para a situação
ter se descarrilhado assim, se seria 40% disso devido à minha desorganização e
talento excepcional para a arte da procrastinação, uns 20% devido à minha
propensão em me sobrecarregar, outros 20% ao meu perfeccionismo, talvez 10% ao
meu computador que não falha em me desapontar e 10% aos problemas de
comunicação com professores e outros... O fato é que, por mais que eu tente racionalizar,
não sei dizer o que gera pra mim esses momentos em que minha vida gira ao redor
de alguns desenhos e apresentações de PowerPoint em um computador, mas o que eu
sei é: o que faz com que eu não consiga sair desse ciclo, independentemente do
cansaço extremo, é o meu gigantesco e intimidante medo de falhar e desapontar.
E ele vem vestindo a roupa do temor por um futuro no qual eu não
"venço" e no qual eu fico revendo na memória esses dias pensando
"Por que diabos eu não virei algumas noites?", e isso torna as coisas
levemente piores.
E
aí vem a nossa tia falar daquele primo que desde muito cedo nunca gostou muito
de sair, passava as noites estudando, não tinha muito assunto com ninguém, e
hoje está fazendo doutorado na Alemanha ou tomando banho na sua piscina de
dinheiro particular. E eu também já cansei de ver esfregada na minha cara a
história da blogueira - só um mês mais nova que eu, diga-se de passagem -
que poderia ser como qualquer outra garota, mas, diferentemente de
qualquer outra garota, tem um império virtual, duas casas próprias, sei lá
quantos livros publicados, aposentadoria vitalícia garantida pros pais que
tanto batalharam para criá-la, e etecetera etecetera e esses tipos de histórias
sempre nos fazem pensar o bom e velho "Por que não eu?", mas não
fazem a gente encarar a verdade do tanto de abnegação envolvidas nesses ditos
sucessos.
E muito fácil ouvir histórias que falam de sucesso calculando
somente a quantidade de esforço e suor, mas sem entender a quantidade de sorte
e de danos envolvidos. Esse texto não é sobre sorte, mas nesse assunto, temos
que admitir duas coisas: 1 - trabalho duro sem uma pitada de "acaso"
dificilmente cria esses casos extraordinários que enchem nossos olhos, e 2 -
temos que entender que só porque reconhecemos que fulano teve sorte com alguma
coisa, ninguém tá falando que fulano não trabalhou duro pra cara***
também.
Depois desse simplificado comentário sobre sorte, eu queria falar
sobre a coisa que realmente me bateu nesse último mês: danos. Eu nunca vou ser
capaz de entrar na cabeça da blogueira e entender exatamente o que ela sente
quando diz que perdeu aquela que poderia ter sido a melhor época da vida dela
pra chegar onde chegou hoje, pode ser que tenha valido a pena ou pode ser que não,
mas independentemente, é exatamente essa parte da história que a gente nem
sempre ouve e por isso vivemos tentando basear a "quantia" de sucesso
que nos é esperada comparando com a dos outros que tem a mesma idade que a
nossa, ou que vieram de mesma situação financeira que a nossa ou quaisquer
outros parâmetros do tipo, quando a única experiência sobre a
qual eu posso falar é a minha própria. E, sendo assim, minha única conclusão
para o estilo de vida e de pensamento que tenho tido é: não tem valido a pena
e, pasmem, se continuar assim, não vai valer a pena daqui a um ano ou mesmo
daqui a uma década.
E se há uma coisa certa nesse mundo é que não adianta falar pra
mim sobre seu colega que "também passou por isso, também abdicou do sono e
da vida social para hoje se tornar um arquiteto bem sucedido, porque
arquitetura é assim mesmo..." quando a questão, na verdade, é que a LUANA aqui
não é assim mesmo... A questão é que a Luana, desde 2012, esteve à beira de um
ataque de nervos pelo menos umas 6 vezes... A questão é que: cada pessoa é
dotada de limites - físicos, emocionais e mentais - que são completamente
PESSOAIS, e muitas vezes queremos forçá-los em nome da obtenção de uma ideia de
sucesso que é extremamente UNIVERSAL, e pra que isso aconteça, a gente
romantiza atitudes auto destrutivas, por exemplo competindo pra saber quem
passou mais noites sem dormir ou quem se valeu das misturas mais mirabolantes
de bebidas e remédios que dão "energia". Quanto mais "véi,
passei o final de semana estudando, não parei um segundo", mais orgasmos
auditivos.
O que eu estou querendo dizer não é que o esforço não é uma parte
importante da vida, é lógico que é. O que estou querendo dizer é que só
recentemente eu tenho começado a entender a diferença entre esforço e
sofrimento. Eu sempre soube que para fazer certas coisas ou chegar a certos
lugares eu deveria me esforçar, e isso é claro e cristalino, mas nos últimos
anos eu tenho sofrido achando que se tratava de esforço e, consequentemente, eu
achava que esse sofrimento era necessário, mas não era. E pensando a
respeito de tudo isso eu cheguei a algumas conclusões extremamente importantes para
mim:
- O que eu achava que
queria fazer e onde eu achava que queria chegar tinha 0% a ver com o que
eu realmente quero e 100% com o que eu achava que era esperado de mim.
- O que é esforço para
uma pessoa, pode ultrapassar os meus limites e se tornar sofrimento pra
mim, então não existe o menor motivo para eu comparar "as coisas que
eu consegui na vida" com as das outras pessoas.
- Essa paranoia de me
tornar uma pessoa que no futuro possa dizer que “tentou tudo que podia fazer”
fez com que minha saúde mental se tornasse um grande pedaço de m*rda.
- Essa mesma paranoia se
tornou (na real, acho que sempre foi) um escudo e uma desculpa para que eu
não lidasse com outras questões renegadas na minha vida, como minha grande
dificuldade de socialização. "Desculpa, tenho que terminar
projeto" alguém já ouviu essa? Eu juro que não é por mal, nem é
mentira, sério mesmo.
- Toda vez, repito, TODA
VEZ que falo sobre esse assunto com alguém, a pessoa sempre se relaciona
em algum nível, seja nas expectativas absurdas, na auto cobrança extrema,
ou na negligencia pela saúde mental e pelas relações interpessoais em
detrimento do sucesso na vida acadêmica/profissional, e em geral essas
pessoas também se sentem infelizes como eu com a forma que estão encarando
a vida, e isso não é um prognóstico legal, galera.
- Pensar em todas essas
coisas e maturá-las em forma de textos, de conversas e de noites sem
dormir de modo algum me garantem que eu não vá voltar a esse mesmo modus operandi na minha vida,
exatamente porque é algo tão arraigado que eu já não sei bem quais são as
outras alternativas. E isso é bem assustador.
No fim, eu só queria dizer mesmo que não é normal se sentir
infeliz, ansioso ou temeroso o tempo todo com a vida que estamos levando, e que
não há vergonha nenhuma em admitir esses sentimentos e buscar uma mudança - e
talvez com auxílio - por algo mais saudável e que se adapte àqueles que são os
nossos quesitos individuais de felicidade, sucesso e realização pessoal.
-Luana Rôla de Sousa
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